23 de julho de 2016

Hábitos - Do Efêmero e Do Vazio


Falava mais alto que todos, sua voz transpassava até a paz da sala que ficava no final do corredor daquele velho prédio de pintura descascada, chicoteando o ar com a extensa língua em acessos cíclicos de antipatia. Diferentemente de seus contemporâneos ele recusava-se a fixar-se em um só lugar, tinha a necessidade de estar em movimento, precisava que seu percurso fosse mapeado pelos olhos de alguém. 
Do agitar dos dedos na cadeira de madeira puída ao engolir seco com o passar das horas num mesmo lugar, eu sei que ele não quer estar aqui, eu também não; o lugar em que eu preciso estar é claro,  é num tempo futuro - por mais que me doa admitir isso eu pertenço às minhas ideias -, o meu coração está com o amanhã, habitar o presente e os seus horrores é o único caminho ao futuro, e é por isso que o trilho, exausto.
O homem que vejo através da sala busca o desconhecido, e isso é o que lhe causa ansiedade: não saber o que lhe move e ainda assim permanecer em movimento imbatível.
Ele caminha orgulhoso de tudo o que pode ser - tem orgulho de sua inquietação pois vê em si um revolucionário nato -, mas ao mesmo tempo lamenta a impermanência de seus vínculos e a solidão do vazio. 
Ser jovem é essencialmente ter medo de crescer e ter medo dos vazios que contrastam com a nossa existência. Sei porque sou e porque tenho. Apesar de ansiar por viver em minhas ideias eu me apavoro em pensar que nem todas elas se tornarão realidade, me apavoro porque aprendi que as coisas são assim, e de fato são.
Eu e ele não rimos das mesmas coisas, pelo menos não até ser conveniente, e não buscamos as mesmas pessoas. A vida em redes é embaraçada. Um nó cego no dia a dia, te ver e tentar lhe conceber como invisível é um dos muitos ecos da minha vontade que nunca assenta. Pertenço ao futuro, talvez por isso queime em fúria momentânea sempre que te vejo.
Rotina da ressurreição. Me acostumei a morrer todos os dias por tudo o que não foi amor. Seguir em frente, seguir a estrada dourada do presente, é voltar a viver.

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