6 de setembro de 2016

Descartes: Felipe Não Mora Mais Aqui


A história a seguir é sobre um amigo. Sob um pseudônimo ele é um amigo, e daqueles queridos. Não estou tentando lhes vender histórias de amor romântico camufladas como amizade. É sobre um amigo, um amigo que sumiu.
Não fisicamente, mas que sumiu. Num poema anterior eu falei sobre amigos que somem, mas este é diferente. Ele sumiu, não avisou que mudou de endereço, não mandou carta de despedida, não respondeu mensagem no celular, ele só sumiu. Felipe sumiu, e agora?
Eu não sei o que sentir; tento me consolar, digo que nostalgia é um bom começo - que saudades do meu amigo e de nossas conversas. Eu reclamava muito das coisas para o Felipe e ele sempre estava disposto a brigar ao meu lado - na verdade ele sempre estava disposto a brigar por quem gostava. Felipe tinha o verbo como um canhão apontado para o além - o coração mirava aquele que lhe parecia merecedor de seus disparos.
Eu tentei imaginar para onde ele foi, e acabei lhe dando um final trágico. Nós, enquanto dupla, sempre gostamos de finais trágicos. "Eu procuro alguém com quem possa escrever um poema, o primeiro requisito é que seja triste, muito triste".
Este texto é um epílogo da fuga de Felipe para lugar nenhum. 
Felipe não mora mais aqui, e nem eu.



"E então ele correu, desesperadamente, procurando por respostas, aterrorizado pela própria consciência e insatisfeito com as verdades à sua frente. 
"No fundo você é um idealista" - ele é alvo de zombaria em frente aos seus dessemelhantes; ele, o sedento e ambicioso anjo de plástico derretendo sob o Sol que é a experiência. Ele quem costumava dizer que poderia superar todos os seus dilemas morais e antagonismos. Você só está disposto a fazer o que for preciso até que tenha que fazê-lo. 
Tem um elefante rosa no meio do caminho e não é possível contorná-lo.
O incômodo precisa ser confrontado, mas todos são pintados com pacifismo e justificativas. O teu sentir será justificado em poucas, afiadas e rígidas palavras - se as tuas emoções não convém então não interessam.
Conciliadores racionais e comodistas. Em cima do muro é um lugar comum, mas a revolução só se dá pelas mãos daqueles que estão dispostos a incomodar e ser incomodados. Nos conciliadores: silenciamentos e dissabores, a prosa bélica é abafada por vozes insossas e tédio. 
O elefante-incômodo é coberto por um grande pano branco, o show lentamente se encerra, uma rosa transpassa o pescoço do palhaço guerrilheiro e a lona do circo-discussão é um estandarte de solidão. Felipe não mora mais aqui."



Este é um texto que eu gosto muito e não me dei conta que não estava publicado, escrevi em meados de março desse ano. "Eu procuro alguém com quem possa escrever um poema, o primeiro requisito é que seja triste, muito triste" - essa citação é da peça do Matheus Nachtergaele, mais precisamente da mãe dele, ele a apresenta como pertencente a um poema dela, e eu amo profundamente essa citação (amei a peça como um todo, me sensibilizou).
Esse é um texto que me faz sorrir sem perceber, talvez seja mais pelo que signifique para mim, não sei, mas fico feliz de poder desenterrá-lo.

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