5 de setembro de 2017

Das De(re)sistências



das poucas certezas que ainda me restam, 
do que em mim ainda é inteiro -

     porque 
   sou, quebrando pelos cantos, 
         carcomendo
              aos poucos, 
                  um alguém esmigalhado; 

caminhando em direção ao profundo
incompleto, sou grato -

eu 
abro mão.


em qualquer lugar do mundo - 

  porque eu 
  nasci para ser apátrida; quando eu tinha
           dezoito anos e fui me alistar no exército,
           o coronel viu meu desapego, das coisas 
           que há para se apegar, nos olhos, e me
                              dispensou - 

me sento, suspiro fundo e,
com o que eu imagino ser um choro
engasgado prestes a ser engolido,

eu me rendo,

apático - ou às vezes, porque
eu tenho gosto pelo drama, me rendo
e desabo.

dias longos. a gente senta e fantasia:
"qual o próximo plano? para onde vamos
agora?" - eu realmente não sei. às vezes eu passo um tempo sem saber.

deito, com os olhos meio mortos - porque eu desisto e morro um pouco - sem saber.

às vezes até choro,
querendo respostas, querendo tudo e, quando me é concedido um desejo (qualquer um mesmo), quero mais um tempo para poder pensar,
para me dar o poder da escolha e, no final, acabar com as mãos cheias de poeira 

- porque o tempo é voraz e o meu querer é, inversamente, uma fera mansa quando arreganha a boca para se satisfazer.

das poucas coisas que me restam,
uma delas é a escolha
sobre as poucas coisas que me restam
e sobre as muitas coisas que eu, precariamente, 
me proponho ser.

das poucas coisas que me restam
uma delas é 
a escolha sobre o que faço
depois que certezas e planos
são reduzidos a estilhaço.

Ilustração por: Art by Shahar


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