17 de dezembro de 2016

Entenda Que Isso é Um Sonho - Allen Ginsberg

| ilustração por: Toshio Saeki |

Real como um sonho
O que devo fazer com esta grande oportunidade de voar?
Qual é a explicação deste planeta, desta lua?
Se eu posso sonhar este sonho / e sonhar qualquer coisa sonhável / será que posso sonhar que estou acordado / e por que fazê-lo?
Quando eu sonho num sonho que acordo / o que acontece quando tento me mover?
Eu sonho que me movo
e o esforço move e move
até que eu me mova / e meu braço dói
Aí eu acordo / desanimado / eu estava acordando enquanto sonhava parado / ainda agora.
e tentar lembrar da próxima vez nos sonhos que eu estou sonhando.
E sonhar o que eu quiser enquanto estou acordado.
Quando estou acordado o que desejo?
Eu desejo preencher a minha barriga emocional.
Meu corpo inteiro meu coração na ponta dos dedos vibra com velhas satisfações.
Páginas de rimas celestiais queimando palavras de fogo
intocáveis mas desaparecem.
Pergaminhos arcanos, eu mesmo e o universo e a resposta.
Barriga a barriga e joelho a joelho.
O jorro quente do meu corpo a tu e tu
velho rapaz / maravilhoso Earl / você Príncipe de Paterson / agora rei de mim / perdido

Haledon

primeiro sonho que me fez abaixar as calças
urgentemente para mostrar os carros / pistas automáticas / rolando avenida abaixo.
A esta altura o que me lembro / além do rosto do líder da gangue, que era loiro / e que me amava / um dia, nos degraus de sua casa, a quadras de distância, à tarde, eu lhe contei do meu feitiço mágico
Eu posso fazer o que eu quiser / milhões de palácios / conjuntos de química / galinheiros / estábulos de cavalos brancos e porões de tortura / Eu inspeciono minhas vítimas acorrentadas de cabeça para baixo / as pontas dos meus dedos deliram em louvor a suas
coxas
bunda branca sem pelos, eu posso beijar o quanto quiser à minha clemência.
Eu passo com meus fortes criados /  eu estou nu
de quatro com minha nádegas à mostra
para seus tapas de reprovação / ó calor do desejo
lamba merda no meu cu.
A estranha gangue do outro lado da rua / depois da mercearia / no beco madeira / a céu aberto,

no canto

Porque eu menti para o dentista sobre o telhado do galinheiro / ardósia roubada de

sua garagem

por mim e pelo rapaz que eu amava - que me puniria se soubesse que o amava.
Que agora eu recuperei aquele rapaz em outra forma loira
Peter Orlovsky, um adolescente chinês em Bangkok dez anos vinte anos
Alistamento militar no campus / rapazotes brancos e loiros /minha boca possui beijos /
cheia de seu pau / meu cu queima / cheio de seu pau
tudo que eu faço é desejo. Em sonho e acordado
este meu belo corpo / respondeu
a tudo que eu desejo / amantes íntimos / de olhos abertos / revelado enfim / roupas no

chão

Roupa íntima reveladora despencando abaixo do umbigo sobre a cama.
Isto é isto / sim sim / os paus retos, as marcas avermelhadas, o gentil pelo púb(l)ico /

sozinho comigo

meu mágico encanto. Meu poder / o que eu desejo sozinho / o que depois de trinta anos /
eu tenho para sempre / depois de trinta anos / suficientemente satisfeito com Peter /
com tudo que eu

queria /

com muitos homens, eu conheci uma geração / nosso esperma passando
em nossas bocas e barrigas / lindo quando eu amo / dado.
Agora que o sonho envelhece / eu envelheço / meu cabelo sem cortes há um ano / meu aniversário de trintaeoito

anos se aproximando.

Eu sonho que
eu sou careca / estou desaparecendo / o campus irreconhecível / Haledon Avenue
será coberta em neon / motéis / supermercados / as varandas de ferro e a madeira substituída quando eu voltar / para ver Earl novamente, ele vai estar careca / pai suculento / eu poderia fazê-lo ir mais além na garagem / se ainda houver uma garagem na colina / no planeta / quando eu retornar.

Da Ásia.

Se eu ao menos pudesse lembrar de seu nome ou rosto / ou encontrá-lo /
Quando eu tinha dez anos / talvez ele exista em alguma forma.
Com uma barriga e um cinto e um automóvel
Qualquer que seja seu último nome / eu nunca soube / na lista telefônica / os registros

Akáshicos.

Eu escreverei minha inspiração para que todos os homens se lembrem,
Minha ideia, a caverna secreta / no closet das roupas / aquela casa provavelmente abaixo /
Nada para retornar / tudo se foi / somente a minha ideia
que está desaparecendo / mesmo nos sonhos / pilhas de poeira acinzentadas / aniquilação instantânea da Segunda Guerra Mundial e todos os seus canhões de aço boquiabertos e sem manchas
muito menos eu e meus beijos de escola de gramática / eu nunca beijei em tempo /
e sigo beijando em sonho e rua afora / como se fosse para sempre.
Não, para-sempre se foi! Mesmo os meus mais velhos para-sempre se foram, em Bangkok, em Benares, varridos com palavras e corpos / tudo dentro do amarronzado Ganges /
passando pelos terrenos em chamas / adentrando o estado opressor.
Minha mente, minha mente / você tem 6 pés de terra para cavar /
Por que você não se lembrou e plantou a semente da Lei e reuniu os brotos

do Quê?

a floração dourada de que ideia? Se eu sonho que eu sonho / qual sonho devo sonhar em seguida? Riquixás motorizados / lampejos de despedida / pequenos

taxis / cavalos

à meia noite nesta rua de Saigon. Angkor Wat à frente e os velhos rostos hindu da cidade arruinada

e havia um sonho sobre Eternidade. O que eu deveria fazer ao acordar?
O que resta para sonhar, mais carne chinesa? Mais encantos mágicos? Mais jovens

para amar antes que eu mude e desapareça?

mais palavras de sonho? Por enquanto que sei que estou sonhando /
Qual é o próximo passo, Allen? Visitar o  Palácio Presidencial entupido de morfina /
os galos cantando / na rua / caminhões do amanhecer / Qual a questão?
Preciso dormir, agora que há luz na janela?
Eu vou dormir. Me desconectarei até / a próxima ideia / o caminhão de mudança chega

vazio

na porta da casa do Doutor cheia de mobília chinesa.*

*Tradução feita por mim.

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